Por que meditar uma hora por dia? Porque vivemos na superfície da alma, com pouco conhecimento sobre Deus ou nossa vida interior. Nosso conhecimento refere-se em grande medida às coisas, não ao destino. A maioria de nossas dificuldades e decepções se deve a erros em nosso plano de vida. Esquecemos o sentido dela, por isso pomos em dúvida até mesmo o seu valor.
Um osso quebrado dói porque está fora de lugar. Nossas almas estão em agonia porque não nos voltamos para a plenitude da Vida, da Verdade e do Amor: Deus.
Por que fazer uma Hora Santa? Eis dez razões para fazê-la.
1.º Investir bem o tempo. — É um tempo gasto na presença de Nosso Senhor. Se a fé estiver viva, não é necessária nenhuma outra justificativa.
2.º Afugentar os demônios do meio-dia (cf. Sl 90,6). — A quem vive atarefado é necessário tempo para assustar os “demônios do meio-dia”, isto é, preocupações mundanas que se agarram à alma como poeira. Uma hora com Nosso Senhor assemelha-se à experiência dos discípulos de Emaús (cf. Lc 24,13-35). Começamos a caminhar com Nosso Senhor, mas nossos olhos permanecem “vendados” para que não “o reconheçamos”. Em seguida, Ele nos fala à alma enquanto lemos as Sagradas Escrituras. A terceira etapa é a de uma doce intimidade, como na ocasião em que “Ele se sentou à mesa com eles”. A quarta é a tomada plena de consciência do mistério da Eucaristia. Nossos olhos “se abrem” e então o reconhecemos.
Finalmente, chegamos ao ponto de não querer deixá-lo ir. A hora parece curta. Fazemos a seguinte pergunta enquanto nos levantamos: “Não se nos abrasava o coração, quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” (Lc 24,32).
3.º Atender a um pedido de Jesus. — Nosso Senhor no-lo pediu. “Então não pudestes vigiar uma hora comigo?” (Mt 26,40). A pergunta foi feita a Pedro, a quem Jesus chama pelo nome Simão. É a nossa natureza de Simão que precisa dessa hora. Se uma já nos parece muito, é porque “o espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mc 14,38).
4.º Equilibrar ação e contemplação. — A Hora Santa mantém o equilíbrio entre contemplar e agir. As filosofias ocidentais tendem a um ativismo para o qual Deus não faz nada e o homem, tudo; as filosofias orientais tendem a um quietismo para o qual Deus faz tudo e o homem, nada. O meio termo está nas palavras de Santo Tomás: “À ação segue-se o repouso”; Marta e Maria andam juntas. A Hora Santa une as dimensões contemplativa e ativa da vida humana.
Graças à hora com Nosso Senhor, nossas meditações e resoluções passam do consciente para o subconsciente, então se tornam motivos para a ação. Um novo espírito começa a permear nossas obras. A mudança provoca-a Nosso Senhor, que nos enche o coração e age por meio de nossas mãos. Só se dá aquilo que se possui. Para dar Cristo aos outros, é necessário possuí-lo.
5.º Fazer o que se prega. — A Hora Santa nos fará pôr em prática o que pregamos. “O Reino dos céus é comparado a um rei que celebrava as bodas de seu filho. Enviou seus servos para chamar os convidados, mas eles não quiseram vir” (Mt 22,2s).
Sobre Nosso Senhor está escrito que passou pelo mundo fazendo o bem e ensinando (cf. At 1,1). A quem pratica a Hora Santa, quando se puser a ensinar, dirão os outros o que já foi dito de Nosso Senhor: “Todos […] se admiravam das palavras de graça que procediam da sua boca” (Lc 4,22).
6.º Ajudar-nos a reparar. — A Hora Santa nos ajuda a reparar os pecados do mundo e os nossos. Quando Jesus apareceu a Santa Margarida Maria Alacoque, foi o seu Coração, e não a cabeça, que apareceu coroado de espinhos. O Amor foi ferido. “Missas” negras, comunhões sacrílegas, escândalos, ateísmo militante… Quem os há de reparar? Quem será Abraão para Sodoma, Maria para os que não têm mais vinho? Os pecados do mundo são nossos como se os tivéssemos cometido. Se eles fizeram Nosso Senhor suar sangue, a ponto de este repreender seus discípulos por não conseguirem permanecer uma hora com Ele, como iremos repetir com Caim: “Sou porventura eu o guarda de meu irmão” (Gn 4,9)?
7.º Tornar-nos menos suscetíveis à tentação. — A Hora Santa reduz a suscetibilidade à tentação e à fraqueza. Apresentar-se diante de Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento é como expor um tuberculoso a ar fresco e luz. O vírus de nossos pecados não pode resistir muito tempo na presença da Luz do mundo: “Ponho sempre o Senhor diante dos olhos, pois Ele está à minha direita; não vacilarei” (Sl 15,8).
A barreira levantada dia após dia pela Hora Santa impede nossos impulsos desordenados de se intensificarem. Nossa vontade vai-se inclinando à bondade, sem necessidade de grandes esforços conscientes. Satanás, qual leão que ruge, só pôde pôr as garras sobre o virtuoso Jó quando teve permissão (cf. Jo 1,12). O Senhor impedirá decerto uma queda grave ao que vigiar (cf. 1Cor 10,13).
Com plena confiança no Senhor eucarístico, a alma terá fortaleza espiritual. Irá recuperar-se rapidamente depois da queda: “Se estou caída, eu me levantarei; se estou sentada nas trevas, o Senhor será minha luz. Suportarei a cólera do Senhor, porque tenho pecado contra ele, até que ele tome em suas mãos a minha causa e deponha em meu favor; até que me conduza para a luz e que eu contemple a sua justiça” (Ml 7,8s).
O Senhor será favorável até aos mais fracos, se estivermos aos pés dele em adoração, preparando-nos para receber os favores divinos. O perseguidor Saulo de Tarso, mal se humilhara perante o Criador, recebeu de Deus um mensageiro para o socorrer, quando ainda estava em oração (cf. At 9,11). Até quem caiu pode esperar tranquilidade, se vigiar e orar: “Eu os exaltarei, e não serão mais humilhados” (Jr 30,19).
8.º Fazer com que tenhamos oração pessoal. — A Hora Santa é uma oração pessoal. Quem se limita ao estritamente obrigatório é como o operário que põe as ferramentas de lado assim que o expediente acaba. O amor começa onde o dever acaba. É como dar o manto aos que nos roubam o casaco. É caminhar um quilômetro mais. “Antes mesmo que me chamem, eu lhes responderei; estarão ainda falando e já serão atendidos” (Is 65,24).
Naturalmente, não somos obrigados a fazer uma Hora Santa, e esse é justamente o ponto. O amor nunca se impõe, nem mesmo no inferno; mas lá ele deve submeter-se à justiça. A imposição do amor, aliás, já seria uma espécie de inferno. De fato, nenhum apaixonado tem a obrigação de propor noivado; ninguém que ame o Sagrado Coração tem a obrigação de lhe dar uma hora de companhia.
“Quereis vós também retirar-vos?” (Jo 6,68) é um amor fraco; “Simão, dormes?” (Mc 14,37), um amor irresponsável; “Ele possuía muitos bens” (Mt 19,22; Mc 10,22), um amor egoísta. Mas quem ama o Senhor teria tempo para outras atividades antes de realizar atos de amor “além das obrigações”? O paciente ama o médico que cobra por cada chamada, ou começa a amá-lo quando o médico diz: “Passei por aqui para ver como você estava”?
9.º Ser um remédio contra o escapismo. — Meditar previne contra a busca de soluções exteriores para preocupações e sofrimentos. Quando dificuldades surgem, ou os nervos ficam à flor da pele por causa das injustiças sofridas, sempre há o risco de olhar para fora em busca de remédio, como fizeram os israelitas.
“Porque aqui está o que disse o Senhor Deus, o Santo de Israel: ‘É na conversão e na calma que está a vossa salvação; é no repouso e na confiança que reside a vossa força.’ Porém, sem nada querer ouvir, vós dissestes: ‘Não, galoparemos a cavalo — pois bem, fugireis, portanto; montaremos corcéis ligeiros’ — pois bem, sereis perseguidos de uma corrida veloz” (Is 30, 15s).
A resposta não está em subterfúgios exteriores nem no prazer, na bebida, nos amigos ou no excesso de ocupações. A alma não pode “galopar a cavalo”; deve “voar” para onde sua “vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3,3).
10.º A Hora Santa é necessária. — Finalmente, a Hora Santa é necessária para a Igreja. Não é possível ler o Antigo Testamento sem ter consciência da presença de Deus na história. Com que frequência Ele se serve de outras nações para punir Israel por seus pecados! Ele fez da Assíria o “bastão que maneja o meu furor” (Is 10,5). A história do mundo, desde a Encarnação, é uma Via Sacra. O nascimento e a morte das nações não são alheios aos planos de Deus. Não podemos entender o mistério do governo divino, pois é um “livro selado” do Apocalipse. João chorou quando o viu (cf. Ap 5,4), incapaz de entender a razão de um momento ser próspero, outro adverso.
A única exigência é a aventura da fé; a recompensa, a intimidade profunda dos que cultivam a amizade com Ele. Permanecer junto de Cristo é ter com Ele uma comunhão espiritual, como Ele instituiu na noite solene e sagrada da Última Ceia, momento escolhido para nos dar a Eucaristia: “Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós” (Jo 15,4). Ele nos quer em sua morada: “Para que, onde eu estou, também vós estejais” (Jo 14,3).
Este artigo é um trecho do livro Lord, Teach Us To Pray: A Fulton Sheen Anthology
Fonte: Padre Paulo Ricardo
Comentários