A verdadeira devoção mariana funda-se num princípio cristocêntrico. Ou seja: é Jesus Cristo, e não a Virgem Santíssima, o fim último da devoção a Nossa Senhora. Esse princípio é de grande importância não apenas por ser a rocha sólida sobre a qual se ergue o nosso amor a Maria, mas também porque nele encontramos o melhor remédio para os escrúpulos de que padecem alguns falsos devotos que, temendo desonrar o Filho, deixam de honrar a Mãe. Trata-se de um receio, aliás, que atormentou na juventude até mesmo o futuro Papa São João Paulo II, e foi justamente o Tratado de São Luís Maria que lhe dissipou qualquer sombra de medo de consagrar-se por inteiro — Totus tuus era o seu lema — à Virgem Santíssima. Não custa lembrar, além disso, que a própria fórmula de consagração que o santo de Montfort nos propõe chama-se “Consagração de si mesmo a Jesus Cristo, Sabedoria encarnada, pelas mãos de Maria”.
Aludimos também, ainda que brevemente, a um segundo princípio sobre o qual repousa esta devoção e que aponta para o fato de que, se queremos ser devotos de nossa Mãe do Céu, devemos imitar as virtudes que ela mesma praticou na terra. Se, com efeito, a finalidade de toda e qualquer devoção é a nossa santificação, pela paulatina configuração ao Senhor, então é mais do que evidente que uma alma consagrada a Maria tem o grave dever de imitar o modelo perfeitíssimo de amor e humildade que nela resplandece.
De fato, todo cristão está chamado, segundo as palavras do Apóstolo, a ser conforme à imagem do Filho unigênito (cf. Rm 8, 29). Mas esta tarefa, se num primeiro momento parece assustadora e acima de nossas forças, torna-se, por assim dizer, mais grata e fácil se primeiro nos deixarmos modelar por aquela que, de todas as criaturas, é a mais perfeita, a mais santa, a mais pura. Não porque ela esteja acima de seu Filho; isto, adverte São Luís, “seria uma heresia intolerável”, mas porque, “para mais perfeitamente bendizer Jesus” e imitá-lo do modo mais fiel possível, “cumpre bendizer antes a Maria” e procurar reproduzir, tanto quanto pudermos, o seu próprio modo de pensar, falar, agir e sentir.
Ouçamos o que o Papa São Pio X escreveu a respeito deste ponto:
Quem quiser, como todos deveriam querer, que a sua devoção à Virgem seja justa e cabalmente perfeita, deve ir mais além e pôr todo o seu empenho em imitar o seu exemplo. Com efeito, é lei divina que os que desejam tomar posse de eterna bem-aventurança reproduzam em si, imitando-as, a paciência e a santidade de Cristo. Porque “os que ele distinguiu de antemão, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que este seja o primogênito entre uma multidão de irmãos” (Rm 8, 29). Ora, dado que a nossa fraqueza é de tal ordem que facilmente nos desanimemos frente à sublimidade de tamanho modelo, Deus nos providenciou um outro exemplar que fosse o mais semelhante a Cristo, tanto quanto é possível à natureza humana, e estivesse mais à altura da nossa fragilidade. E este modelo não é outro que a Mãe de Deus.
Se o próprio São Paulo não temeu dizer aos fiéis de Corinto: “Tornai-vos meus imitadores” (1Cor 11, 1), que motivo teríamos nós para recear tomar como modelo aquela que, maior do que todos os Apóstolos, imitou da maneira mais perfeita possível as virtudes do nosso Redentor? Maria é, portanto, o molde com o qual Deus quer formar os seus santos, é a “fôrma” em que somos lançados para adquirir o formato e a figura de Jesus. Ela foi o ventre em que Deus feito homem desejou ser formado, e é também por meio dela que ele quer produzir irmãos semelhantes a si, que reproduzam suas feições e, sendo filhos de um mesmo ventre materno, possam clamar ao mesmo Pai celeste: “Abba!” (Gl 4, 6).
Fonte: Padre Paulo Ricardo
Fonte: Padre Paulo Ricardo
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