Deus não muda. É definitivamente pleno, portanto, imutável. Está, pois, inalteravelmente presente em nós e não admite diferentes graus de presença. O que realmente muda são nossas relações com ele, conforme nosso grau de fé e amor. A oração torna mais firmes essas relações, produz uma penetração mais entranhável do Eu-Tu, através da experiência afetiva e do conhecimento fruitivo. E a semelhança e a união com ele chegam a ser cada dia mais profundas.
Acontece como um archote dentro de uma sala escura. Quanto mais archote alumia, melhor se vê a "cara" da sala, a sala se faz "presente" ainda que não tenha mudado.
Podemos provar pela experiência que, quanto mais profunda a oração, mais sentimos a presença de Deus, patente e vivo. E quanto mais resplandecente a glória do rosto do Senhor sobre nós (Sl 30), os acontecimentos ficam mais envoltos de novo significado (Sl 35) e a história fica povoada por Deus. Numa palavra, o Senhor se faz vivamente presente em tudo. Não há sorte ou azar, mas um timoneiro que conduz os fatos com mão firme.
Quando alguém já "esteve" com Deus, ele cada vez mais vai sendo alguém por quem e com quem se superam as dificuldades e se vencem as repugnâncias (elas se convertem em doçuras). Assumem-se com alegria os sacrifícios, nasce em toda parte o amor. Quanto mais se "vive" com Deus, mais vontade de estar com ele, e quanto mais se está com Deus, Deus é cada vez mais Alguém. Abriu-se o círculo da vida.
Na medida em que o contemplador avança nos mistérios de Deus, Deus deixa de ser ideia para converter-se em Transparência e começa a ser Liberdade, Humildade, Prazer, Amor e, progressivamente, se transforma em Força irresistível e modificadora, que tira todas as coisas de seus lugares: onde havia violência, põe suavidade; onde havia egoísmo, põe amor e muda por completo "a face" do ser humano.
Se o contemplador continua avançando pelas obscuras rotas do mistério de Deus, forças desconhecidas ativadas pelo Amor empurram a alma para dentro do Deus vivo, por uma rampa totalizadora em que Deus vai sendo cada vez mais o Todo, o Único e o Absoluto, como num torvelinho em que o homem inteiro é apanhado e arrastado enquanto se purifica e as escórias egoístas são queimadas. Deus acaba por transformar o homem contemplador numa tocha que arde, ilumina e resplandece (Jo 5,35). Pensemos em Elias, João Batista, Francisco de Assis, Carlos de Foucauld, etc.
Não podemos dizer: isso não é pra mim. Tudo depende da altura, ou melhor, da profundidade da contemplação em que nos encontramos. Esses profetas não foram excepcionais por nascimento ou casualidade, mas porque se entregaram incondicionalmente e se deixaram arrastar cada vez mais para dentro. É verdade que essa entrega exigiu deles um estado interior de alta tensão, apesar de que o escultor de tais figuras foi, é, e será Deus. Não pensemos só nos tempos passados. Hoje em dia, há, entre nós, homens que são viva transparência de Deus.
Mas não termina aqui o processo totalizador. Tanto quanto o contemplador se deixar tomar, Deus monopoliza nesse homem a função de bem que contém todas as realidades humanas e tendem a converter-se em Todo o Bem: para esse homem, Deus "vale" por uma esposa carinhosa, por um bom irmão, por um pai solícito, por uma fazenda de mil hectares ou por um palácio fantástico (Mt 12,46-50; Lc 8,19-21; Mc 3,31-34). Numa palavra, Deus se converte na grande recompensa, em um festim, em um banquete (Ex 19,5; Jr 24,7; Ez 37,27). "Tu és o meu Bem" (Sl 15). "Teu nome é meu prazer, cada dia" (Sl 88).
É isso que o salmista expressa admiravelmente quando diz: "Mas tu, Senhor, puseste em meu coração mais alegria do que quando abundam o trigo e o vinho" (Sl 4). O "trigo e o vinho" simbolizam todas as compensações, emoções e prazeres que o coração humano pode desejar. Para o homem contemplador, que "saboreou quão suave é o Senhor" (Sl 33), Deus tem o "sabor" de um vinho embriagador, é mais saboroso que todos os festins da Terra.
Bem provou Francisco de Assis, o homem mais pobre do mundo. Passava noites inteiras sob o céu estrelado, exclamando, enquanto sentia uma sensação plenificante: "Meu Deus e meu tudo!". Sentia aquilo que os vivedores, os sibaritas e amantes jamais suspeitariam:
"Saciar-me-ás de prazer em tua presença, de delícias eternas à tua direita" (Sl 15).
Fonte: Trecho retirado do livro "Mostra-me o Teu rosto - Caminho de intimidade com Deus", de Inácio Larrañaga
Comentários