A narrativa de São
Lucas sobre a Anunciação de Maria (Lc 1,26-38) mostra como o cristão deve viver
o mistério da Encarnação do Verbo de Deus. Mensagem sublime que o anjo Gabriel
trouxe do céu a esta terra, dizendo à Virgem de Nazaré: “Eis que conceberás e darás
à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus” (Lc 1,31). Ao dar o seu consentimento
aos planos divinos Maria ensina a todos os cristãos como encarnar em si a
Palavra Eterna do Ser Supremo.
A docilidade de
Maria à ação do Espírito Santo, ao poder do Todo-Poderoso, tornou possível que
a Segunda Pessoa da Trindade Santa tomasse também a natureza humana. A todo
batizado cumpre uma total submissão aos desígnios celestes. A sujeição mariana
fez conhecer ao mundo a Palavra que salva, fazendo resplandecer na História a
graça e a verdade. Num momento de belíssima inspiração Santa Catarina de Sena exclamou:
“Ó Maria, em ti o Verbo está escrito e dele temos a doutrinada vida. És a tábua
que nos propicia esta doutrina”. Idêntico é o pensamento de São Sofrônio de
Jerusalém que chama Maria o “Livro de Deus”, livro aberto de Cristo, Sabedoria
Eterna, porque no seu seio virginal ela pode contemplar e escutar o próprio
Filho de Deus. Ela, com razão, é então dita pela Igreja Mãe e Mestra da vida
espiritual. Ela se revela como a palavra bíblica que, graças a seu sim generoso
e obediente, fez com que se desse esta katábase impressionante, ou seja, a
descida de Deus a este mundo tornando a carne idêntica a todos os homens. Mostra,
deste modo, como se deve receber tudo que o Pai revelou. Evangelho vivo, a
Virgem Mãe é uma especialista em teologia: os mistérios da Encarnação redentora
lhe foram entregues antes de todos os teólogos, fazendo-a intimamente unida a
toda História da Salvação.
Ela faz parte da
confissão de fé cristológica e ela deve ser considerada na totalidade da
Encarnação histórica do Senhor Jesus. Santo Inácio de Antioquia registrou uma
fórmula antiga de fé que diz: “Cristo verdadeiramente nasce de uma Virgem …
verdadeiramente foi pregado na Cruz … verdadeiramente sofreu, como
verdadeiramente ressuscitou”. Tudo isto teve início por que Maria respondeu ao Mensageiro
divino: “Eis aqui a serva do Senhor: faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc
1,38). Em comunhão com Maria e com sua gratuidade íntima que a tornou mãe de
uma maneira extraordinária, a Igreja professa a Encarnação do Verbo e celebra
os mistérios da salvação, anuncia a morte redentora do Senhor e proclama
jubilosamente sua vitória sobre a morte e fica esperando a vinda gloriosa do
grande triunfador Jesus Cristo no final dos tempos.
Em
cada celebração, o que aconteceu com Maria na Anunciação ocorre ou deve se dar
na assembleia reunida em nome de Jesus. Quem escuta o Verto Eterno de Deus na
Liturgia da Palavra encarna em si mesmo o Verbo para celebrar com o Senhor seu
mistério sacramental. Desta maneira é que o Cristo-Palavra se faz sacerdote e
chama os fiéis se tornando luz para suas inteligências e força para suas
vontades na Eucaristia. No diálogo com o anjo a Virgem assumiu a maternidade
divina de maneira responsável, deixando exemplo admirável.
Na sua conversa com Gabriel a Virgem não duvidou, mas ficou estupefata diante
da grandeza daquele fato e perante uma novidade incompreensível de um anúncio
maravilhoso. Isto mostra como todo cristão deve sempre invocar as luzes do
Espírito Santo para bem saber o que é melhor para sua santificação e salvação,
dando total adesão a Deus.
Ela
patenteia como se deve assimilar a Palavra, isto é, assim como o organismo
humano converte em substância própria o alimento, do mesmo modo é preciso
transformar a palavra divina em vida espiritual, borbulhante e irradiante,
engendrando o Verbo de Deus no pensar e no agir. Sobretudo em cada Missa
dominical é necessário que o fiel se pergunte: “Como encarnar em mim tudo que
me veio através da liturgia desta semana?” Para tanto se faz mister invocar
então a proteção poderosa daquela que se intitulou a serva do Senhor. Se alguém
acha difícil praticar os ensinamentos hauridos nas celebrações, se lembre das
palavras do Anjo Gabriel: “Para Deus nada é impossível”.
Ainda
que o Espírito Santo esteja a exigir uma correção dolorosa nos caminhos
tortuosos por vezes trilhados, a Tesoureira das graças divinas, ajudará a uma
revisão semanal de vida. O Concílio Ecumênico Vaticano II colocou em evidência
expressamente o papel de exemplaridade, desempenhado por Maria em relação à
Igreja na sua missão apostólica, pois ela continua a sustentar a todos os
cristãos no generoso empenho de encarnar em si a Palavra de Deus.
Con. Vidigal
Professor no Seminário de Mariana – MG
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