A vida de oração parece algo distante, custosa ou até mesmo impraticável para a maioria dos leigos. Mas isso acontece por um erro de conceito e não pela vida de oração de fato.
A oração é um respiro da alma, ou como ensina Santa
Teresa D’Ávila “um trato de amor com Aquele que sabemos que nos ama”.
Quanto mais nos relacionamos com Deus, mais unidos
a Ele queremos estar e por isso vamos crescendo no conhecimento de nós mesmos e
aborrecendo nossos defeitos e faltas.
Escrevo sobre 6 meios de estarmos unidos a Deus em
nosso dia a dia.
1- O
motivo sobrenatural
Falamos muito sobre fazer tudo por amor e
santificar o trabalho, mas na prática você sabe como fazer isso?
Muitas pessoas pensam que fazer tudo por amor é
sentir algo. Bom, de fato pode até ser, naturalmente falando, como por exemplo
quando se dá esmola e a ação foi movida por algum sentimento. Mas esse tipo de
ação puramente natural e humana, apesar de ser boa, não recolhe méritos nem nos
faz progredir na santidade.
Por isso, como nos ensina o padre Royo Marín, na
doutrina da graça devemos fazer tudo por amor a Deus. E como isso acontece?
Renovando continuamente nosso ‘motivo sobrenatural’ de cada ação.
Os santos faziam isso naturalmente por inspiração
do Espírito Santo: a cada nova ação que faziam, ofereciam por amor a Deus. Mas
nós precisamos nos esforçar para adquirirmos este hábito.
Não basta aqui apenas o oferecimento geral do dia.
Precisamos, a cada ação, dizer: “Senhor, lavo estas louças por Vosso amor.” ;
“Senhor, agora troco estas fraldas em reparação por tal pecado.”. Não é preciso
dizer em voz alta, apenas em voz interior.
Podemos pedir ao nosso anjo para nos ajudar a
lembrar; podemos convidar a ele, a Jesus e a Maria para fazerem as coisas
conosco.
Se começamos alguma ação e no meio dela cometemos
algum pecado venial, devemos renovar o motivo sobrenatural. Lembrando que é
preciso estar em estado de graça sempre.
Se olharmos nosso trabalho e vocação apenas com
olhos humanos, sempre nos frustraremos. Mas se abrirmos os olhos sobrenaturais,
descobriremos o tesouro de que todas as pequenas coisas que fazemos podem ter
relevo de vida eterna.
Também não é simplesmente pôr um motivo e trabalhar
de qualquer jeito. É importante procurar trabalhar sempre com perfeição, ainda
que muitas vezes o resultado não seja tão bom.
Santificar o trabalho não consiste em realizar algo
santo enquanto se trabalha, mas em tornar santo o próprio trabalho pondo o
motivo sobrenatural.
Todo trabalho é santificável, desde o mais
brilhante aos olhos humanos até o mais humilde, pois a santificação não depende
do tipo de trabalho mas do amor a Deus com que o realizamos.
2- Exame
de Prevenção
São Francisco de Sales e Santo Inácio de Loyola
reforçam que fazer o Exame de Prevenção pela manhã nos ajuda a antecipar
situações que acontecerão durante o dia e os meios para não cair em faltas.
Dessa forma não seremos pegos desprevenidos.
São Francisco de Sales escreve em Filoteia a
respeito da oração da manhã, destacando uma parte para o Exame de Prevenção:
“Muito útil é preveres as
ocupações deste dia, as tuas ocasiões prováveis de glorificar a Deus, as
tentações que te proporcionará a cólera, a vaidade ou uma outra paixão. Feito
isto, prepara-te por uma santa resolução a aproveitar bem de todos os meios que
terás para servir melhor a Deus e progredir na perfeição; ao contrário,
arma-te: com toda a firmeza de espírito para evitar ou para combater e vencer
tudo o que lhe servir de obstáculo. Esta simples resolução, porém, não é
bastante; é preciso firmá-la em prevendo os meios que te serão disponíveis para
pô-las em prática. Por exemplo: se prevejo que irei tratar com uma pessoa
facilmente irascível, sobre um negócio, não só me hei de precaver dos meios que
me estarão a disposição, para não ofendê-la, mas também, para que não se ire,
verei como lhe falar branda e gentilmente ou, se for necessário para contê-la,
pedirei a outras pessoas que o façam junto comigo. Se prevejo que tenho de
visitar alguns doentes, disporei tudo a hora, todas as circunstâncias, as
maneiras mais próprias de consolá-los e os socorros que lhes poderei levar.”
Ele prossegue dizendo que esta oração se faz
brevemente ao acordar, não é necessário ficar se delongando e pensando demais.
Este exame me ajuda muito a evitar pequenas faltas
no dia, a antecipar situações que terei de lidar, problemas que terei de
corrigir e tudo isso faz com que meu dia aconteça com mais consciência das
minhas ações e seja menos improvisado e tempestuoso. Por exemplo, se dormi mal
e acordo com mau humor, já sei que neste dia terei de me esforçar para sorrir,
para não exigir demais das crianças, para não cair em cóleras e saber disso já
me deixa predisposta a estar mais atenta e esforçada. Ajuda muito mesmo!
3- Exame
Particular de Consciência e Exame Geral de Consciência
Os exames particular e geral andam de mãos dadas e
são diagnósticos espirituais que nos ajudam no conhecimento de nós mesmos.
A diferença entre um e outro é feita na primeira
semana dos Exercícios
Espirituais de Santo Inácio. De forma simplificada, o exame geral é
aquele que se faz ao final do dia, onde analisamos todas as ações moralmente
significantes do dia que conseguimos nos lembrar. Enquanto o exame particular
trabalha em uma falta em particular com a qual se tem especial dificuldade e a
virtude oposta a ela que estamos tentando cultivar.
O Exame Particular é de especial eficácia porque
trabalha efetivamente sobre algo que precisamos corrigir e acompanhar nosso
progresso. Ao contrário do que se pensa, quando colocamos nossa atenção em
vários defeitos ao mesmo tempo, tendemos a andar em círculos em vez de agir de
forma certeira. Também é muito oportuno trabalhar de forma positiva para
alcançar a virtude que estamos desejando buscar ao corrigir tal defeito. E sem
dúvidas, um dos maiores frutos que se colhe é que ao corrigir algo
efetivamente, outras virtudes vão crescendo junto, pois uma virtude puxa a
outra.
Então, ao invés de sermos generalistas, temos de
ser bem específicos e corrigir algum defeito que esteja atrapalhando nossa vida
familiar ou comunitária ou algo privado. Se alguém, por exemplo, não dá atenção
ao marido, deve tratar disso no Exame Particular. Ou se passa muito tempo no
celular, se grita com os filhos, se faz fofoca, e por aí vai.
Como diz no livro Imitação de Cristo: “Se corrigíssemos um defeito por ano, em
breve seríamos Santos”.
Como fazer os Exames: https://salvemaria.com.br/exame
4-
Orações jaculatórias
São Francisco de Sales escreve em Filoteia:
“Eleva muitas vezes o teu
espírito e coração a Deus, Filotéia, por jaculatórias breves e ardentes. Admira
a excelência infinita de suas perfeições, implora o auxílio de seu poder, adora
a sua divina majestade, oferece-lhe tua alma mil vezes por dia, louva sua
infinita bondade, lança-te em espírito aos pés de Jesus crucificado,
interroga-o muitas vezes sobre tudo aquilo que concerne a tua salvação, saboreia
interiormente a doçura do seu espírito, estende-lhe a mão, como uma criancinha
a seu pai, pedindo-lhe que te guie e conduza(…). Muito aconselhava Santo
Agostinho a virtuosa senhora, por nome Proba, a recitação das orações
jaculatórias, porque, se nossa alma se acostuma a tratar tão familiarmente com
Deus, aos poucos copiará em si as perfeições divinas. E é de notar bem que este
exercício nada tem de difícil e não é incompatível com tuas ocupações; só o que
é necessário são alguns momentos de atenção, o que, longe de perturbar ou
diminuir a atenção do espírito aos negócios, a torna mais eficaz e suave. (…)
Com este intento compuseram-se diversas coleções de
orações jaculatórias, que tenho por muito úteis; entretanto, não aconselho que
te fixes a isso; contenta-te em dizer com o coração ou com os lábios tudo
quanto o amor te inspira no momento, pois ele te inspirará tudo o que podes
desejar.”
Em outro capitulo ele escreve: “Lembra-te, as mais
vezes que puderdes durante o dia, da presença de Deus. (…) verás que Deus tem
continuamente os olhos pregados em ti com um amor inefável. Ó meu Deus, hás de
exclamar, por que não emprego sempre os meus olhos para contemplar-Vos, assim
como Vós estais sempre olhando para mim com tanta bondade? Por que pensais
tanto em mim, Senhor? E por que eu penso tão raras vezes em Vós? Onde é que
estamos nós, minha alma? A nossa verdadeira habitação é em Deus, e onde é que
nos achamos?”
Esses bons pensamentos/desejos/pedidos que são as
orações jaculatórias são uma forma muito eficaz de mantermos o recolhimento e o
espírito orante durante as ocupações do nosso dia. No começo parece difícil
lembrar de tratar com Deus tantas vezes, mas conforme vamos nos esforçando e
avançando neste exercício, logo se torna constante a lembrança Divina.
5- O
lugar de repouso
São Francisco de Sales nos ensina que “nosso
coração deve escolher para si também, todos os dias, um lugar ou no Calvário ou
nas chagas de Jesus Cristo ou em algum outro lugar perto dEle, para se retirar,
de tempos em tempos, para repousar do cansaço e da agitação dos negócios
exteriores e para se defender dos ataques do inimigo. Sim, três vezes feliz é a
alma que em verdade pode dizer a Nosso Senhor: Vós sois o meu lugar de
refúgio, a minha fortaleza contra os inimigos, à sombra de vossas asas respiro
um ar dulcíssimo e estou seguro, ao abrigo das intempéries do tempo.
Lembra-te, Filotéia, de retirar-te muitas vezes à
solidão do teu coração, ao passo que as tuas tarefas e conversas o ocupam
exteriormente enquanto interiormente estás a sós com teu Deus.
Estando o bem-aventurado Elzeário, conde de Ariano,
na Provença, ausente desde muito, a sua esposa, a piedosa e casta Delfina,
enviou-lhe um mensageiro expressamente para informar-se do estado de sua saúde
e ele respondeu do modo seguinte:
“Vou indo bem, minha querida esposa, e, se me
queres ver, procura-me na chaga do lado do nosso amantíssimo Jesus; é lá que eu
moro e aí me acharás; querer procurar-me noutra parte é um trabalho perdido”
Este ensinamento de São Francisco é um verdadeiro
tesouro. Todos nós devemos eleger um lugar para repousar em Cristo, seja no
Divino Peito, em alguma chaga, aos pés da cruz, no estábulo ao lado da
manjedoura, no monte das bem aventuranças recolhendo seus ensinamentos ou em
tantos outros lugares que a vida Dele nos dá. É fato que cada um de nós elegerá
um lugar para si que mais se sente atraído, e ali encontraremos nosso descanso,
forças renovadas, contemplação, consolo e tanto mais.
6-
Leitura Espiritual
“Tem sempre contigo um bom livro
de devoção (…). Lê-o por algum tempo todos os dias, mas com tanta atenção como
se um santo o enviasse expressamente para te ensinar o caminho do céu e
encorajar-te a trilhá-lo. Lê também as vidas dos santos, onde verás, como em um
espelho, o verdadeiro retrato da vida devota, acomodando os seus exemplos aos
deveres do teu estado.” (São Francisco de Sales, Filoteia)
Ou como dizia Santa Teresinha: “Só tenho de olhar o Evangelho, logo respiro os perfumes da vida de
Jesus e sei para que lado correr”.
Muito útil é a leitura e meditação dos Evangelhos
para que possamos conhecer, amar mais a Cristo e aprender como agir em tantas
situações. Podemos ler um trecho e escolher alguma parte que mais nos chamou a
atenção para ficar ruminando durante o dia. Assim vamos nos recordando do
ensinamento lido e pensando nele vamos recebendo iluminações da graça e fixando
as verdades eternas em nossa inteligência. Além do que, evitamos assim passar o
tempo pensando em coisas inúteis.
Neste mesmo intuito também podemos acompanhar a
liturgia diária da Igreja, que é composta pelas leituras, salmo e santo
Evangelho. Nossa família religiosa do Verbo Encarnado disponibiliza canais com
homilias diárias de nossos sacerdotes! São excelentes maneiras de meditar a
vida de Nosso Senhor (Spotify, Telegram, Youtube, Whatsapp).
Ter um livro para meditar, ler a vida dos Santos
e a Sagrada Escritura são meios muito eficazes de nos levar a Deus, de
alimentar nossa alma e nosso intelecto, de desabrochar em nós os bons desejos e
pensamentos.
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Ao primeiro olhar essas práticas podem parecer
complicadas e exigentes, mas com o tempo vocês verão que elas se acomodam
perfeitamente ao nosso dia a dia sem exigir de nós grandes tempos ou
dificuldades.
E mais, elas nos encaminham cada vez mais a união
com Deus, a uma vida interior profunda que não deseja nada além de se abandonar
nas mãos Daquele que é o nosso centro, o nosso Tudo.
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