O matrimônio e a família não carecem de dificuldades. Reconhecia com honestidade Paulo VI: “Não é nossa intenção ocultar as dificuldades, as vezes graves, inerentes à vida dos cônjuges cristãos; para eles, como para todos, estreita é a porta que leva à Vida. A esperança desta vida deve iluminar seu caminho enquanto se esforçam animosamente para viver com prudência, justiça e piedade no tempo presente, conscientes de que a forma deste mundo é passageira” – Humanae Vitae, 25.
Os conflitos mais duros se dão no plano dos afetos e das vontades.
Talvez sejam receios, desconfianças, discussões, rancores, faltas de perdão.
Talvez se trate de faltas morais graves como infidelidade, mentiras,
violências, fortes discussões, etc. Contudo, com frequência, os atritos são de
ordem menor, ainda que possam terminar ocasionando sérios danos, rachaduras
familiares, incluindo dolorosas separações. Não deveríamos estranhar que
pequenos atritos façam tão mal ao casamento visto que pequenas rachaduras,
quando não cuidadas a tempo, terminam por causar grandes desabamentos. Mesmo
que não cheguem a tanto, são suficientes para tornar a vida familiar amarga e,
certamente, são um obstáculo sério para a felicidade.
Onde há dois, há material suficiente para uma
discussão
Não busquemos desculpas sem sentido para justificar discussões. “É que
pensamos diferente” – dizem. E onde é que vamos encontrar duas pessoas que
pensem exatamente igual em tudo? Se a harmonia dependesse disto não haveria
esperança de concórdia nesta vida. Não há duas pessoas exatamente iguais nesta
vida, é justamente por isso que as pessoas se casam! Não há duas coisas mais
diversas do que uma chave e uma fechadura, e trabalham perfeitamente juntas!
Podemos concluir daqui que os principais problemas familiares e matrimoniais não
são psicológicos e de temperamentos (ainda que causem distúrbios) mas sim,
espirituais. Dito de outro modo, são problemas de virtudes. De um dos dois ou
dos dois.
E isto tem solução? Claro que sim! uma solução fácil de formular e
difícil de cumprir. Mas que vale a pena sendo seu resultado a felicidade.
A solução consiste na prática das pequenas virtudes. Tomo a expressão
“pequenas virtudes” de São Marcelino Champagnat, que por sua vez se inspirou em
São Francisco de Sales.
São Marcelino explicou este tema em certa oportunidade em que um irmão
foi ter com ele incomodado por algo que achada inexplicável. Poucos dias antes
havia sido destinado a uma comunidade de religiosos que era, segundo seu
próprio parecer, virtuosos, cumpridores de todas as regras e desejosos de
santidade, mas para sua surpresa a união que reinava entre eles estava longe de
ser perfeita. Via, de um lado, religiosos virtuosos e do outro numerosas
misérias domésticas, sem poder precisar qual era a raiz do problema nem
tampouco sua solução.
Se isto vale para os religiosos também se ajusta aos leigos,
especialmente aos casados. Há muitos que pensam que bastam as coisas principais
para que reine a paz, mas não é assim. As pequenas virtudes são essenciais e
necessárias e, se faltam, nunca se conseguirá a felicidade diária!
Para resolver estes problemas, nosso santo amigo nos traz uma lista
destas pequenas virtudes e suas descrições:
1 – O perdão
Desculpe as falhas do próximo, as diminua, as perdoe facilmente e não
espere que faça o mesmo para si. A vida familiar não é uma competição, não
fique anotando as vezes que perdoou para perdoar na mesma medida. Lembre-se,
amamos o próximo porque Deus nos ama!
2 – A caridosa dissimulação
Haja como se não soubesse dos defeitos, insensatez, falhas e palavras
pouco atentas do próximo e suporte sem dizer nada ou queixar-se. A correção
fraterna não engloba todos os defeitos senão apenas os mais graves. Além disso,
depois de ter corrigido seu próximo, é necessário sofrer e suportar pois há
defeitos que só são curados desta forma. Há almas virtuosas que, por mais que
se esforcem, não conseguem corrigir certos defeitos, Deus as usa como exercício
de virtude para aqueles que devem suportá-los.
3 – A compaixão
Compartilhe do sofrimento dos que padecem para suavizá-los: isso nos
impulsiona a tomar parte nos trabalhos de todos e a intervir os fazendo
nós mesmos.
4 – A santa alegria
Compartilhe também do gozo dos que estão felizes! Mas com intenção de
aumentá-los.
5 – A flexibilidade de ânimo
A não ser por motivos muito sérios, jamais imponha a alguém suas
opiniões senão que admita o bom e racional que há nas ideias dos demais e
aplauda sem inveja os bons entendimentos do próximo para conservar a união e
caridade fraternas. É a renúncia voluntária de seus intentos pessoais e a
antítese da obstinação e intransigência das próprias ideias. Se ainda assim
insistir no pensamento “Eu tenho razão e não posso sofrer com os disparates e
erros dos demais” lembre-se da resposta de São Roberto Belarmino, doutor da
Igreja: “Mais valem duzentos gramas de caridade do que cem quilos de razão”.
6 – A caridosa solicitude
Ajude o próximo antes que ele peça, para facilitar-lhe a vida e
evitar a humilhação de pedir ajuda. É belíssima esta bondade de coração de quem
nada sabe negar, que está sempre pronto para servir e presentear a todos.
7 – A afabilidade
Responda aos importunos (chatos rs) sem mostrar a mais leve impaciência!
Sempre esteja pronto para ajudar os que pedem seu auxílio, instruir os
ignorantes sem se cansar e com toda paciência! Numa oportunidade, São Vicente
de Paulo interrompeu uma conversa que levava com pessoas “importantes” para
repetir cinco vezes a mesma coisa a alguém que lhe interrompera e não o
entendia bem, instruindo, na última vez, com a mesma tranquilidade com que o havia
feito na primeira.
8 – A civilidade e a cortesia
Se antecipe a todos nas demonstrações de respeito, atenção e cortesia e
ceda sempre o primeiro lugar para os demais. As demonstrações de estima
manifestadas com sinceridade fomentam o amor mútuo, assim como o óleo serve de
alimento ao fogo de uma lamparina e sustenta a chama que produz a luz, sem isto
não há união possível nem caridade fraterna.
9 – A tolerância
Se incline para agradar aos inferiores, escute suas observações e mostre
que as aprecia mesmo que nem sempre sejam perfeitamente fundadas. A tolerância,
diz São Francisco de Sales, “é não buscar o próprio interesse, apenas o do
próximo e a glória de Deus”.
10 – O interesse pelo bem comum
Prefira o proveito da comunidade e ainda o dos demais ao seu próprio, se
sacrifique pelo bem dos irmãos e pela prosperidade do lar!
11 – A paciência
Sofra, tolere, suporta sempre! Nunca se canse de fazer o bem mesmo que
aos ingratos, chegando a dar graças aos que te fazem sofrer. Santa Teresa de
Calcutá repetia constantemente a Deus: “Vos amo não pelo que me dais, mas pelo
que me retirais”. Este é o verdadeiro caminho para ter paz e conservar a união
com todos.
12 – A igualdade de ânimo de de caráter
Seja sempre o mesmo, não se deixe levar por alegrias loucas, cóleras,
melancolias, maus humores. Permaneça sempre bondoso, alegre, afável e contente!
Estas são as chamadas pequenas virtudes. Como se percebe, são virtudes
sociais, logo, são muito úteis a qualquer um que viva em sociedade. Sem elas as
comunidades e famílias estão em desordem e agitação contínua e, por consequência,
assim também está o país e o mundo. Sem elas não é possível alcançar a paz
familiar que é nosso maior consolo neste vale de lágrimas.
Pratiquemos estas pequenas virtudes para tornar nosso lar e nossa vida
amáveis!
Fonte: Blog Lírio Entre Espinhos
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