Quando uma sociedade está pautada em valores morais e éticos e as suas ações se voltam para a coletividade em detrimento dos interesses individuais, cria-se de imediato uma verdadeira estratégia de ética nas eleições. Trabalhar o problema na raiz traz resultados mais eficazes do que esperar acontecer a tragédia para agir. Combater é muito mais difícil do que prevenir. Daí faz-se necessário anunciar a ausência ou melhor a quase inexistência em nossa sociedade de uma ética inserida na concretude do voto, revelando o quanto a sociedade é vazia deste valor.
Escutamos sempre a alegação: “este negócio de ética na democracia cada um tem a sua”. Porém, imaginar que cada um tem a sua e que o grupo não deve tê-la é algo impensável. Os pensadores Rosseau e Lincoln afirmavam que a democracia é o regime “do povo, pelo povo e para o povo”. Kelsen, por outro lado, acreditava que a democracia se baseia no voto e na liberdade (seja ela de consciência, de religião ou de trabalho).
A palavra “democracia” tem origem na Grécia Antiga e, etimologicamente, é o poder do povo (demos = povo e kratos = poder). Em síntese, é a forma de governo em que vigora, substancialmente, a soberania popular. A soberania popular, conforme informa o artigo 14 da Constituição Federal, “será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”. A palavra sufrágio vem do latim “sufragium” e significa apoio, aprovação. O sufrágio é a manifestação de vontade da soberania popular e tem o voto como principal instrumento.
Por sua vez, o voto é um direito personalíssimo conferido aos cidadãos (não pode ser exercido através de procuração). Tem como principais características a universalidade, a personalidade, a obrigatoriedade, a sigilosidade, a igualdade, a periodicidade, e a liberdade. No Brasil, o voto é secreto (em nenhuma hipótese pode ser revelado), obrigatório (é um direito; é um dever social, político e jurídico), direto (somente o eleitorado escolhe seus governantes) e igual (o voto tem o mesmo valor) para todos, sem qualquer distinção.
O voto é obrigatório e igual para homens e mulheres, entre 18 (dezoito) e 70 (setenta) anos e facultativo entre 16 (dezesseis) e 18 (dezoito) e acima de 70 (setenta) anos. A lei, ainda, prevê sanção para ausência não justificada nas eleições, como multa e cancelamento do título de eleitor. No dia, ainda, o eleitor pode escolher votar em quaisquer dos candidatos inscritos, ou votar em branco ou nulo.
É importante destacar, também, a distinção entre os votos em branco e nulo. Enquanto o voto nulo é a manifestação do eleitor que não está de acordo com nenhuma das candidaturas postas, o voto em branco traduz a vontade do eleitor de não opinar no pleito eleitoral. No Brasil, os votos em branco e nulo são apenas registrados para fins estatísticos, não sendo computados para nenhum candidato ou partido político, ou seja, não são votos válidos.
Outrossim, é de suma importância destacar o que dispõe o artigo 60, § 4º, inciso II, da Carta Magna. Vejamos: Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: (...) § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: (...) II - o voto direto, secreto, universal e periódico. O dispositivo acima mencionado é uma cláusula pétrea e, por isso, não pode ser abolido por emenda à Constituição, somente com a instituição de novo Poder Constituinte, com uma nova Constituição. Nota-se, portanto, que o voto é de extrema importância para o atual ordenamento jurídico vigente, tanto é que ganhou uma cláusula especial na Carta Magna.
Na Igreja Católica vemos que Documento conciliar Gaudium et Spes (nº 75) assim trata o assunto: “É plenamente conforme com a natureza do homem que se encontrem estruturas jurídico-politicas nas quais todos os cidadãos tenham a possibilidade efetiva de participar livre e ativamente (…) na gestão da coisa pública (…) e na escolha dos governantes.
Eticamente os cristãos católicos têm o dever moral de promover o bem comum ao exercer o seu privilégio de voto (cf. CIC, §2240). As autoridades civis não são as únicas responsáveis pelo país. “O serviço do bem comum exige dos cidadãos que cumpram com a sua responsabilidade na vida da comunidade pública” (CIC, §2239). Isto significa que os cidadãos devem participar do processo político na urna de votação.
Por fim, o fato mais relevante é demonstrar com o voto a necessidade de se educar o cidadão brasileiro com princípios éticos e morais que devem nortear a vida em sociedade. Por mais que o combate à corrupção seja importante, é imprescindível difundir a cultura da prevenção nos lares, escolas, administração pública ou privada. A saída mais ética será sempre prevenir com o voto consciente do que remediar.
Por Fernando Acácio de Oliveira
Yasmin Maia Viana
Yasmin Maia Viana
¹ Yasmin Maia Viana é bacharel em Direito pela FDCI (Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim). Pós-graduada em Direito Eleitoral pela Damásio Educacional. Advogada (OAB/ES 23.544).
² Fernando Acácio de Oliveira é seminarista da Diocese de Cachoeiro de Itapemirim-ES, licenciado em Filosofia pela FCS-ES, especialista em Comunicação Social pela PUC-SP/SEPAC-Paulinas e pós-graduado em Sagrada Escritura pelo Centro Universitário Claretiano-SP. Atualmente está graduando em Teologia no IFTES-ES e pós-graduando em Direito Matrimonial Canônico no ISTA-BH.
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