Os ensinamentos e a vida de São Bento, pai do monaquismo ocidental, santo dos primeiros séculos do cristianismo (480 d.C.), têm vencido as barreiras do tempo, ensinando-nos de modo muito eficaz a combater os males da secularização (deriva da palavra saeculum, que no uso comum termina por indicar o tempo presente - aeon atual, segundo a bíblia, por oposição à eternidade - aeon futuro, “séculos dos séculos”, da bíblia; um período de tempo extremamente longo e indefinido tornando-se sinônimo de temporalidade, de redução do real somente à dimensão terrena), que tem adoecido sobremaneira as mentes e consciências dos homens e feito com que ele perca seu referencial de valores.
A correria rotineira, a busca daquilo que só agrada a vontade, a opressiva exigência social do poder, do conquistar posições, da vida financeira estável, do relacionamento perfeito, o “ter que” aderir às constantes inovações tecnológicas, científicas e filosóficas, tudo isso, se nos mostra como imposição para a felicidade. É como se nada fora disso pudesse dar paz ou vitória em nossos projetos. Perece um jogo: sempre as mesmas regras, os mesmos obstáculos, o que tenho que eliminar para, quais armas ou golpes, qual o objetivo e, se não chegar lá, “game over” (fim de jogo), não ganha e aí está tudo perdido, não se é “bom” o suficiente, não tem valor, é perdedor, não corresponde aos padrões de perfeição do mundo.
Para escapar e não ser engolido por este rodamoinho é preciso voltar-se num constante processo interior de olhar a si, de não deixar-se levar e, ter a coragem de não se conformar, ser autêntico e verdadeiro consigo mesmo, questionando: Quem sou eu? Para que nasci? O que estou fazendo? Onde quero chegar? Pode acreditar! Essas quatro perguntas levam a respostas que mudam de forma definitiva as escolhas e, conseqüentemente, a vida de uma pessoa. É nesse processo de entendimento da própria identidade e daquilo que buscamos, que o venerável Bento entra como um norte, se o quisermos, nos ensinando a desvencilharmo-nos das amarras sociais, pois ele não teve medo de romper com elas. Nascido na Itália, Núrsia, no seio de uma nobre família cristã piedosa e respeitável, foi enviado a Roma ainda menino, em virtude de seus estudos e permanecendo lá por sete anos obteve progresso notável, mas já adolescente resolveu deixar Roma para afastar-se daquela mocidade frívola da metrópole, cada vez mais induzida à libertinagem, ao vício e à corrupção. Desprezando os prazeres do mundo e suas efêmeras promessas e desejoso em servir a Deus, põe-se no encalço, somente, do santo hábito monástico. Bento se levanta com desassombro. Desgostoso do ambiente em que vivia ele procura entregar-se a vida cristã mais intensa, rompe com as muralhas da cultura que cercava a elite do seu tempo, não está preocupado com opiniões e convenções, mas com aquilo que arde em seu coração, pois já descobriu dentro de si algo que não é secular, mas atemporal, o próprio Cristo. Ele sabe o que busca, sabe o que quer e de quem deseja se aproximar. Tinha tudo em sua vida para se tornar um homem notável no campo das letras, da arte retórica. Podendo estudar muito, conseguiria trabalhar nos mais altos cargos, usufruindo de poder, privilégios e reconhecimento, mas, no entanto, se retira numa região deserta, dentro de uma gruta, no Subiaco, onde vive por três anos, sendo alimentado por um monge que lhe trazia uma cesta com comida e fazia descê-la por uma abertura na parte superior. Ali ouviu de Deus santos conselhos, que mais tarde dariam origem a sua tão conhecida Regra, que orienta os tantos mosteiros existentes no mundo, segundo a Ordem que leva seu nome. Além do mais, uma vida acompanhada por grandes manifestações de Deus. Tudo isso porque, cheio de desprendimento, teve a ousadia de ouvir o que estava em sua alma e buscou entender mais e mais o Sagrado e o que Este queria dele.
Parece estranho alguém deixar seu berço cheio de regalias para viver na solidão e pobreza, pois achamos que os projetos que a vida secular nos oferece são extraordinários e representam o que há de melhor. Se Bento tivesse acreditado nisso, não teria se lançado aos planos de Deus e nem teria chegado a beatitude. Qualquer um pode renunciar ao convencional, ao normal, aos paradigmas velhos e cansativos que nos levam a uma vida medíocre e sem graça. É só pensar um pouco e chegaremos a seguinte conclusão: Deus me criou no agora para o sempre. Podemos viver num mundo secular seguindo os passos do eterno.
Que São Bento nos ajude combater a superficialidade a que nos acostumamos, para alcançarmos o grau mais elevado de todos, a santidade.
São Bento, rogai por nós!
Natália Monteiro Patusse
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